domingo, 18 de novembro de 2012

Crônica do dia da Consciência Negra


De Zumbi ainda não sabemos o nome, além do Francisco. Padre Melo nas tantas cartas que enviou a amigos lhe referiu sempre na condição de “pai”, ou pai, citando somente o primeiro nome. Já se conhece uma carta enviada pelo Rei, (D. Pedro II) a Zumbi, nela é tratado só por  ‘Capitão Zumbi”  Das muitas cartas que certamente Zumbi enviara, a céus e terra, tantas para a realeza, ainda não  conhecemos seus textos, portanto não se sabe como assinava. Mas Zumbi foi batizado, com certeza em convento oficial. Mesmo os acentos do batismo a Igreja Católica nunca o exibiu a nenhum historiador, pesquisador, ou à Nação, por dever.

Com o arranjo “Consciência Negra”, o Legislativo dá uma no cravo e outra na ferradura – ou seja, “atende” à comunidade negra e  não contraria à doutrina de estado do Estado Brasileiro. A República ainda não comporta uma homenagem a Zumbi. E não comporta por dois motivos: a) Uma das razões está no âmbito do Cristianismo;  b) a outra está nas relações da América Latina com a Europa, uma relação de dependência, ainda com fortes características coloniais.

A escravidão africana foi um engenho de duas mãos de um mesmo corpo – A Europa:  a) pensado e gerido pelo Cristianismo; b) sustentado militarmente pelos grandes impérios Europeus da época. O Cristianismo tem como pano de fundo, como coluna de sustentação a morte. O próprio Cristo, só se torna divindade em função da morte; a sua “vida” (do Cristo), se dera pela morte, e só se dera pela morte;  o objetivo só podia ser alcançado pela morte, etc. Ora, para o cristianismo se o Estado Brasileiro reverenciar a Zumbi o estará  colocando no mesmo patamar  de Jesus Cristo, e Zumbi foi Um dos “neófitos” a quem o cristianismo não pode dar “atestado de bons antecedentes”.

A segunda razão está na relação de dependência da América para com a Europa. A Escravidão Africana na América foi obra da Europa. Quem lucrou, em todos os sentidos, com a escravidão africana foi a Europa. E só a Europa. Com a independência dos países da América, cada um deles, até mesmo os EUA, assume a responsabilidade pela Escravidão Africana. A Europa como que “transferiu” todos os danos da escravidão para estas novas nações. Assim o Brasil fica responsável pelo seu período de escravidão e não Portugal. E não a Inglaterra enriquecida.

O Cristianismo urde a escravidão africana dentro da mais “absoluta e perfeita legalidade” projetada para nunca ser questionada; a Europa a manteve a ferro e fogo sob a mesma égide do inquestionável. E assim mantêm, a Europa via suas ex-colônias, o espólio da escravidão africana sob acordos militares e para-militares debaixo do mesmo entendimento do inquestionável. Uma homenagem a Zumbi, um rebelado, na condição de Herói, iniciará a ruir o instituto do inquestionável. O inquestionável é de tal ordem importante na história da Escravidão Africana que talvez em toda a América Latina, (no Brasil com certeza), apenas Perdigão Malheiros se lhe  referiu.

Confrontar à Escravidão Africana no Brasil começou por Palmares, a que nós projetamos os milhares e milhares de negros em Zumbi. A reparação da Escravidão Africana começará, em qualquer tempo, por Palmares, por Zumbi. Esta reparação não isentará a Europa. Neste sentido será prudente que nas nossas manifestações culturais, notadamente a capoeira, que percorrem o Mundo iniciem as divulgações deste nosso entendimento.
*Matéria originalmente publicada no Portal Capoeira em Novembro de 2006 - Publicação especial mês da Consciência Negra.
André Pêssego – Berimbau Brasil, SP

André Pêssego é Técnico Industrial, especializado em eletrotécnica; autor, escritor, Praticante de capoeira, (sem virtude alguma na arte mãe.) Berimbau Brasil, Grupo do mestre João Coquinho.

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